Amigos da A Professora Tia Lilian

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

As pinceladas de Vincent com os escritos de Pessoa

 
(Le moulin de La Galette, 1886)
 
O guardador de rebanhos
(Poema de Fernando Pessoa)
 
Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.
 
 
Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela
dar por isso.
 
 
Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles
são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.
 
 
Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que
chove mais.
 
 
Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.
 
 
E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),
 
 
É só porque sinto o que escrevo
ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão
 por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.
 
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